quinta-feira, 6 de março de 2008

Imagem da mulher na publicidade lança novos desafios ao feminismo


Silvana Mota Ribeiro detectou estereótipo nos anúncios

O facto de haver uma sobrecarga de mulheres extremamente belas na publicidade pode afectar ou determinar a auto-percepção feminina face ao seu próprio corpo ou beleza. Este alerta é lançado pela investigadora da Universidade do Minho Silvana Mota Ribeiro, que estudou 109 imagens publicitárias, que durante um mês foram publicadas em nove revistas femininas. A autora do livro “Retratos de Mulher” defende que a «invasão» deste padrão de mulher lança novos desafios ao feminismo.

A docente encontrou um «padrão comum» às imagens que analisou, publicadas ao longo de um mês, tanto em revistas mensais, como em semanais. «Há um padrão comum do feminino, que é determinado por traços bem definidos. Eu não encontrei grandes excepções a nenhum dos traços que descobri», explica.

Como refere a professora universitária e orientadora da tese de mestrado que serviu de base ao livro “Retratos de Mulher” Carolina Leite, «apesar da suposta diversidade dos modelos do feminino, perpetua-se um discurso único sobre o entendimento de género». «Sob a imagem sedutora da publicidade, há pouca diversidade de modelos do feminino, contrariando a ideia que temos no dia-a-dia», afirma.

Silvana Mota Ribeiro considera que «o critério de beleza apresentado em todas as imagens é baseado em padrões muito bem definidos em termos de magreza e de idade». «Em alguns anúncios em que o texto dizia que determinado produto de cosmética era para mulheres com 40 anos, a figura feminina apresentada tinha, no máximo, 30 anos», constata.

Em seu entender, numa sociedade em que a juventude «ainda é uma obsessão», este tipo de anúncio pode «afectar a visão do que deve ser a aparência de uma mulher aos 40 anos». «Se está ali uma mulher de supostamente 40 anos, que tem aquele aspecto, nós começamos a achar que, se calhar, com 40 anos, também deveríamos ter aquela imagem», salienta.

Este bombardeamento constante de figuras belas e jovens faz com que «a noção do que é o aspecto feminino aos 40 anos e do que é o envelhecimento saudável sejam adulterados».

«A exclusão começa pelas próprias mulheres. Não nos esqueçamos que a linguagem visual tem um poder imenso sobre a nossa auto-percepção e em termos corporais isso é ainda mais flagrante. As mulheres percebem-se como diferentes das imagens que vêem. São elas que se excluem daquele padrão e que se sentem de algum modo desconfortáveis com a sua diferença face ao padrão», refere.

A investigadora sublinha que as mulheres olham para as páginas das revistas e vêem «um universo possível, alcançável por toda a gente, quando o que na verdade é transmitido é um universo fantasista, apresentado como se fosse uma norma a seguir».

Imagem feminina
continua redutora


A investigadora notou uma mudança em relação às imagens estereotipadas do passado. Desapareceu a imagem da «mulher doméstica, que cozinha e cuida da casa». Com o “desaparecimento” do avental e do marido dos anúncios, surgem mulheres jovens e belas, mas o conceito redutor mantém-se.

Silvana Mota Ribeiro argumenta que, na perspectiva feminista, as imagens que são transmitidas pela publicidade «são igualmente redutoras». «Já não há o estereótipo da redução da mulher ao lar. A mulher aparece mais no sentido estético e visual», sublinha.

Em seu entender, a questão que se põe é a de saber «como é que o feminismo lida com isso, de modo a despertar a consciência das mulheres de que aquilo que elas vêem diariamente não é o retrato de um padrão muito mais emancipador do que o padrão dos anos setenta, dos aventais e dos maridos». «É diferente, mas não é necessariamente mais emancipador. E isso é, seguramente, um desafio para o feminismo», declara.

Na mesma linha, Carolina Leite defende que é importante «ir para além da denúncia e tentar definir as novas coordenadas do feminismo». «A herança do feminismo tem de ser lida, entendida e actualizada. Caso contrário, será apenas uma relíquia ou uma ideia simpática», afirma.

Silvana Mota Ribeiro não rejeita o facto de ter avançado por um caminho que envolve questões consideradas de natureza política e ideológica. «A questão da denúncia é extremamente importante porque o trabalho deve começar pelas próprias mulheres e pelo modo como elas olham para essas imagens», explica.

Esta especialista em Ciências da Comunicação frisa que não é seu objectivo assumir «uma posição militante, apontando por exemplo caminhos ou mudança para a publicidade». Contudo, afirma que já ficará «satisfeita» se as «mulheres começarem a ver as imagens com uma perspectiva mais crítica».

A investigadora entende que é necessário aprofundar esta temática, tentado perceber o que é que mulheres reais pensam «quando vêem o modelo muito rígido, marcado, repetitivo e redutor» que é apresentado pela publicidade. Isto porque algumas entrevistas levadas a cabo em conjunto com a docente universitária Zara Pinto Coelho a jovens universitárias indicam que as elas vêem estas imagens «emancipadoras e não como redutoras».

1 comentário:

Samuel Silva disse...
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