segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Cidadãos impedidos de votar

Foto: Fila para saber o número de eleitor na EB 2,3 André Soares (Braga). DR

O que se passou nas eleições Presidenciais de dia 23 de Janeiro foi demasiado grave para que termine sem que sejam apuradas responsabilidades políticas: houve pessoas impedidas de exercer o seu direito de voto devido às confusões provocadas pelo Cartão do Cidadão. O pedido de desculpas do ministro da Administração Interna, vindo tarde e a más horas, a realização de um inquérito pela Universidade do Minho e o pedido de demissão de dois bodes expiatórios – o director-geral da Administração Interna e o director da Administração Eleitoral – são insuficientes perante a gravidade do que aconteceu neste acto eleitoral.

Estas eleições vão, provavelmente, ficar para a história como aquelas em que a abstenção atingiu os 53,37 por cento [o valor foi actualizado para53,48 por cento nos resultados finais]. Deveriam era ficar na memória como aquelas em que houve pessoas a aguentar estoicamente em filas para saber o número de eleitor – em Braga houve eleitores à espera durante uma hora – e em autênticas correrias para conseguir chegar a assembleias de voto onde nunca pensaram ter de ir votar. Por exemplo, Maria José Nogueira Pinto relata no “Diário de Notícias” que ela e o marido, morando na mesma casa, souberam no dia das eleições que passaram administrativamente a votar em sítios diferentes. Sem que ninguém os tenha avisado antecipadamente...

A questão central é que se avançou para um novo modelo de identificação sem estarem reunidas as condições mínimas para o seu funcionamento. O deslumbramento pelo poder da tecnologia fez-nos ter um Cartão do Cidadão muito moderno, com muita informação lá dentro, mas sem coisas básicas como o número de eleitor. Resultado, domingo, as pessoas viram-se com um pedaço de plástico na mão que não lhes servia para nada quando as outras coisas igualmente muito modernas, como o portal na Internet e o sistema de aviso por SMS, deixaram de funcionar. O novo sistema foi apresentado aos cidadãos como tendo múltiplas vantagens, mas afinal só lhes veio é complicar ainda mais a vida.

Há quem queira culpar os cidadãos pelo que se passou, porque não se preocuparam em saber atempadamente o seu número de eleitor e o local onde teriam de votar. Sejamos honestos: não se pode atribuir aos eleitores a culpa de não saberem um número que os serviços do Estado é que têm a obrigação de facultar. Quando procedimentos administrativos feitos em cima do joelho põem em causa os princípios democráticos, o caso é demasiado sério para que se encare como mais uma tontice da era Sócrates.

[Publicado no Diário do Minho, 28 de Janeiro de 2011]

1 comentário:

M. disse...

Realmente, num mundo já tão automatizado, por que não enviar simplesmente uma carta para cada novo titular a informar sobre o novo número? Ou, pelo menos, informar desse facto quando é solicitado o cartão.
Bjsss,
Madalena