segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Tolerância zero


O Governo aprovou na passada quinta-feira, em Conselho de Ministros, uma proposta para reforçar o combate à violência doméstica, prevendo a possibilidade de o agressor ser detido fora de flagrante delito e a utilização de meios electrónicos para controlo à distância dos arguidos.

Segundo o secretário de Estado
Adjunto da Justiça, no primeiro trimestre de 2009, ficam disponíveis as 50 pulseiras electrónicas que foram adquiridas para controlar à distância os agressores e evitar que se aproximem das vítimas.

A União das Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) está a levar a cabo a campanha "Eu não sou cúmplice", que apela ao comprometimento masculino na luta contra a violência doméstica, que já contou com a adesão de motards do Porto.

Sábado foi lançada a campanha contra a violência no namoro, desenvolvida pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, com o intuito de «promover relacionamentos afectivos saudáveis» entre os jovens.

Estas iniciativas surgem num país onde este ano já houve, de acordo com o Observatório de Mulheres Assassinadas, 43 vítimas mortais devido à violência dos companheiros ou ex-companheiros...

Num país onde uma em cada quatro relações de namoro na adolescência é marcada pela violência, tal como revela a tese de douroramento da investigadora Sónia Caridade...

Num país onde todos os anos são sinalizados três mil casos de maus-tratos físicos e psicológicos a crianças e jovens...

É chocante ouvir quem lida diariamente com estes problemas constatar que o sistema de justiça não tem «o tempo das pessoas» ou a sensibilidade que seria exigível. Mas é ainda mais perturbador ver que, no dia-a-dia, em “conversas de café”, a piada fácil é mais forte do que a reflexão sobre o que esta taxa de violência nas relações íntimas diz sobre nós.

Estes números deveriam envergonhar-nos profundamente, mas parece que muitas vezes são olhados de ânimo leve. Como se eles fossem apenas dados estatísticos e não traduzissem pessoas concretas, que se calhar até conhecemos. Este é um fenómeno transversal, que não acontece só na casa de quem nada tem a ver connosco.

Em Junho tive oportunidade de fazer uma reportagem sobre a violência doméstica para o Diário do Minho. Recordo-me das palavras das vítimas e das suas expressões, mas sobretudo de um momento que nunca poderei esquecer. No local público onde estive a falar com uma vítimas, uma mulher que se apercebeu do assunto veio ter comigo e, apesar de não me conhecer, disse que também fazia parte dos números deste pesadelo, como se verbalizar o problema fosse uma forma de o exorcizar.

Amanhã assinala-se o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres. Este, como todos os “dias de”, vale o que vale. Mas valerá muito se, de uma vez por todas, adoptarmos uma posição de tolerância zero perante a violência doméstica.

Foto UMAR

[Versão de artigo publicado no Diário do Minho de 23 de Novembro de 2008 e de post já aqui colocado]

Sem comentários: