domingo, 6 de julho de 2008

Agir por reflexo


Um cão saliva quando vê carne. Se se associar a carne ao som de uma campainha, ao fim de algum tempo, o animal começa a salivar quando ouve o toque, mesmo que à sua frente não esteja qualquer pedaço de comida. Esta é uma experiência científica muito conhecida, a que se dá o nome de “Cão de Pavlov”. Ivan Pavlov mostrou que há reflexos que são condicionados, o que significa que são aprendidos com a repetição de determinado estímulo.

É na esteira desta experiência que o director de marketing da Central de Cervejas disse, em entrevista ao “Meios & Publicidade”, que o objectivo da empresa é «criar um movimento pavloviano». Depois de patrocinar a Selecção Nacional de Futebol, a Sagres dá agora nome à Liga Portuguesa, circunstância ideal para nos pôr a salivar e colocar a marca na liderança do mercado. «Queremos criar um movimento pavloviano, quando eu ouvisse ou visse futebol me apetecesse ter uma Sagres na mão e beber uma cerveja. A rotina e a frequência podem trazer isso», afirmou Nuno Teles.

Para alcançar esta meta, a empresa reuniu uma equipa multidisciplinar, com quatro agências de publicidade (Fischer, McCann, Partners e Elec3city), uma agência de relações públicas (Cunha Vaz & Associados) e uma agência de meios (Arena). Esta é uma estratégia perfeitamente normal, numa altura em que até está em pleno desenvolvimento o “neuromarketing”, que consiste em estudar as respostas do cérebro a determinada mensagem, com o objectivo de a tornar mais eficaz.

Os spots da Liga Sagres estão a ser rodados por todo o país. O plano de filmagens contemplava a presença de adeptos do Sporting de Braga na Praça da Oliveira (Guimarães) e de adeptos do Vitória de Guimarães na Arcada (Braga), eventualmente numa mensagem de sã convivência entre os clubes. No guião não estava a cena em que um jovem vestido com a indumentária do Vitória foi atingido com uma chávena, na quarta-feira à noite, em plena Arcada.

O futebol tem muito de emotivo e irracional, por isso é necessário um cuidado acrescido nos estímulos que se reforçam. Nesse sentido, é de lamentar que algumas campanhas, mesmo de clubes, remetam para um imaginário de violência. O desporto é, seguramente, muito mais do que agredir os adeptos adversários num reflexo pavloviano ou salivar por cervejas.

[Artigo publicado no Diário do Minho de 5 de Julho de 2008]

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