Maria Morena é o pseudónimo de uma jornalista que assina um trabalho na edição desta semana da Notícias Sábado. Essa jornalista ficou grávida, decidiu fazer um aborto e depois contar a sua “estória”. O relato é acompanhado por uma conversa com a médica que a atendeu, de uma pequena caixa com o resultado de 38 telefonemas para os hospitais do Serviço Nacional de Saúde que realizam abortos e outra com os números das interrupções voluntárias da gravidez.
Estes artigos levantam algumas questões:
1 – Estamos perante o exercício de jornalismo?
2 – O que um jornalista escreve é jornalismo se cumprir o aspecto formal dos géneros jornalísticos? Depende dos temas? Depende da intenção? Depende do meio em que for publicado? De que depende?
3 – Há alguma diferença substancial entre fazer um aborto e contar a “estória” na primeira pessoa, entre fazer uma dieta e escrever sobre a perda de peso ou entre ir viver três meses para rua uma reportagem sobre os sem abrigo?
4 – Verifica-se alguma colisão com o artigo 1.º do Código Deontológico, que diz que «o jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público»?
5 – E em relação ao artigo 10.º do Código Deontológico, que refere que «o jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesses»?
6 – O Estatuto do Jornalista estipula que «é condição do exercício da profissão de jornalista a habilitação com o respectivo título, o qual é emitido por uma Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, com a composição e as competências previstas na lei». É diferente o texto estar assinado com o nome que a jornalista tem na carteira profissional ou estar assinado com um pseudónimo?
7 – Estamos perante uma verdadeira entrevista quando a autora do texto diz: «decidi [...] também convidar a médica Maria José Alves a escutar as minhas questões, enquanto jornalista; já tinha escutado também os meus apelos, enquanto paciente, no pico da agonia»? Onde termina a paciente e começa a jornalista? Onde termina a médica-assistente e começa a entrevistada?
8 – A mulher fotografada é a jornalista? Se é, para quê o anonimato, uma vez que ela será facilmente reconhecida nos meios mais próximos? Se não é, a imagem visa exactamente o quê?
Sobre este assunto, o comentário de Ademar Santos no Abnoxio.
Publicado no Trio de Rachar, 8 de Julho de 2010.
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