sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Transformação dos estereótipos só aconteceu a nível superficial


Aos angolanos é atribuído um papel lúdico e pouco valorizado na sociedade


Nos estudos exploratórios do trabalho sobre os processos cognitivos subjacentes à discriminação social, a investigadora Rosa Cabecinhas averiguou quais os grupos raciais ou étnicos mais relevantes na sociedade portuguesa e de que forma estes são percepcionados, o que permitiu seleccionar um grupo minoritário de origem africana para os trabalhos seguintes: os angolanos.

Entre outros aspectos dos resultados obtidos, a docente da Universidade do Minho destaca que «se registou uma evolução no conteúdo dos estereótipos, uma vez que os membros do grupo dominante evitam caracterizar os membros do grupo dominado com traços muito negativos e, em alguns casos, caracterizam-nos com traços mais positivos do que o próprio endogrupo», contudo «esta transformação opera-se a um nível superficial e não a um nível profundo».

«Esta metamorfose em que a xenofobia parece ter dado lugar à xenofilia esconde uma flagrante permanência: as dimensões mais valorizadas nas sociedades ocidentais (autonomia, individualidade, competência, responsabilidade) continuam a ser negadas ao grupo dominado. A manutenção dos significados associados aos estereótipos torna-se particularmente evidente quando consideramos as dimensões de conteúdo exclusivas de cada grupo: a instrumentalidade e a competência para o grupo dominante e a expressividade e o exotismo para o grupo dominado», salienta.

Outro aspecto que Rosa Cabecinhas enfatiza diz respeito aos papéis que são atribuídos a cada um dos grupos: «enquanto ao grupo dominante são associados traços que remetem para um papel activo na sociedade (trabalhadores, activos, empreendedores, etc.), ao grupo dominado são associados traços que remetem para um papel decorativo ou lúdico (cheios de ritmo, musicais, sensuais, etc.)». «Este papel lúdico atribuído aos angolanos constitui também uma forma de permanência, se o virmos à luz das representações do “negro” durante o período do colonialismo. Assim, o predomínio de traços juvenis e exóticos nos angolanos, que os limita a um papel lúdico, denuncia a permanência da oposição entre a especificidade destes e a universalidade de portugueses», frisa.


Racismo subtil mais elevado
do que o flagrante


Num trabalho destinado a averiguar as percepções e as atitudes dos portugueses face a seis grupos-alvo, a académica pôde constatar que, «à semelhança do que tem sido verificado noutros estudos europeus, o racismo subtil foi significativamente mais elevado do que o racismo flagrante», embora globalmente os níveis de discriminação tivessem sido bastante baixos. De um modo geral, os participantes demonstraram «claramente o seu desacordo com as expressões mais abertas de racismo (sentimentos de ameaça e rejeição do exogrupo, crença na inferioridade genética do exogrupo, rejeição de intimidade, etc.), mas também as suas formas mais subtis (acentuação das diferenças culturais entre o endogrupo e o exogrupo, negação da expressão de emoções positivas face ao exogrupo, etc.), especialmente quando o grupo-alvo era designado em função da cor da pele».

Para Rosa Cabecinhas, isto pode acontecer pelo facto da «designação “negros” ser reconhecida como activando respostas que possam ser conotadas com racismo». «Sendo os participantes neste estudo pessoas com elevados níveis de escolaridade e bem cientes das normas sociais em vigor contra a discriminação baseada na cor da pele é natural que a inibição provocada pela designação negros seja mais forte do que a provocada pelas designações nacionais», justifica, sublinhado que houve mesmo participantes que sentiram necessidade de «justificar as suas respostas para que elas não fossem conotadas com racismo».

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