sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

A âncora que nos salva ou que nos afunda?

Seguir os noticiários nos dias de hoje é, por vezes, um exercício penoso. As supostas notícias dividem-se, na maior parte das vezes, entre os casos do dia, repletos de sangue e outros ingredientes clássicos para chamar imediatamente a atenção, e o trabalho de agenda. E por trabalho de agenda entende-se a cobertura de acontecimentos previamente anunciados, tais como inaugurações, colóquios ou conferências de imprensa.

Independentemente do formato, desde a simples folha de papel colocada sobre uma mesa da redacção até ao mais elaborado programa on-line, a agenda é a espinha dorsal que garante o noticiário seguinte. Mas, numa área marcada pela imprevisibilidade, pode ser uma âncora que nos salva ou que nos afunda. Tudo depende da inteligência com que se usa.

O facto de haver agenda é uma espécie de “tábua de salvação”, pois ao assegurar que os jornalistas vão cobrir determinado número de eventos dá a garantia de que o espaço não vai ficar por preencher. Contudo, deixa os meios humanos demasiado ocupados para que se dediquem à pesquisa de outros assuntos, geralmente mais complicados e que não dão garantias de poderem ser publicados no dia seguinte.

Para além da apresentação de uma informação predominantemente institucional, como refere Louis Guéry, em “La Presse Régionale et Locale” (1992), a rotina «pode provocar uma certa esclerose, na medida em que dispensa os jornalistas de todo o esforço de imaginação. Se eles não estiverem alerta, são levados a “ronronarem” e a produzirem informação sem grande originalidade».

Os jornalistas, alerta o mesmo autor, estão sujeitos à «tentação de se contentarem em encher as colunas do jornal com a informação recebida», quando «a arte e o talento é, nestes casos, não somente fazer o resumo do que chega, mas descobrir no meio dessa prosa insípida a notícia que pode originar uma boa reportagem ou o facto que merece que um dos responsáveis seja entrevistado».

Olhando para o que está à nossa volta, há seguramente redacções inteiras em sono profundo. E consumidores de informação que se deixam embalar pelo som que elas emanam...

Publicado no Trio de Rachar, 6 de Dezembro de 20007

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