domingo, 15 de março de 2009

E os pais servem para quê?!


A V Feira de Livros de Saldo e Manuseados de Braga terminou no passado domingo, batendo o recorde de visitantes e de publicações vendidas. A organização bem pode agradecer à PSP e à comunicação social a preciosa ajuda na divulgação do certame. A promoção – completamente de borla – levou o nome da feira além-fronteiras.

Independentemente das considerações que possam ser feitas sobre a impensável actuação da Polícia, que apreendeu cinco exemplares do livro “Pornocracia”, de Catherine Breillat, com o polémico quadro de Gustave Courbet “A origem do mundo” na capa, este foi um caso que viveu muito à custa da projecção mediática.

A “estória” tinha todos os ingredientes para ganhar espaço na comunicação social, independentemente da sua real importância para a manutenção da liberdade de expressão em Portugal: o insólito da situação, os protagonistas dispostos a alimentar a polémica, um tema de cariz sexual, o precedente criado pelo episódio de Torres Vedras, a época de Carnaval, que faz com que hard news escasseiam, e o enquadramento (preconceituoso e anacrónico) de Braga como uma cidade tradicionalista de província onde podem acontecer as maiores alarvidades.

Apesar do destaque que o episódio teve, tanto em notícias como em artigos de opinião, desde os jornais de referência aos blogues, o facto que terá estado na origem da intervenção da PSP acabou por ser negligenciado na vertigem de querer ver nos três agentes que foram à tenda instalada na Avenida Central uma ameaça ao Estado de Direito.

De acordo com o segundo comandante da PSP, citado pela comunicação social, as autoridades foram chamadas pelas mães e pelos pais das crianças que brincavam nas imediações e que foram atraídas pelo livro que se encontrava em exposição. A ser assim, isto revela algo muito preocupante sobre a educação que (não) está a ser dada às crianças. É absurdo que seja preciso chamar a Polícia para acautelar a ordem pública por causa de um livro.

Sem ter estado presente no local na altura da apreensão, o que me parece mais lógico é que os pais, vendo os filhos de volta de um livro que não consideravam apropriado, os levassem dali para fora ou aproveitassem a ocasião de forma pedagógica para falar da liberdade da expressão, do corpo humano ou de arte. A solução mais fácil é, seguramente, chamar a PSP e passar a “bata quente” para os outros. Assim, até parece que o que qualquer pai tem a fazer é chamar a Polícia ou os bombeiros quando não conseguir controlar as birras das suas crianças...

[Publicado no Diário do Minho, de 11 de Março de 2009]

[Imagem tirada daqui]

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